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Especialistas continuam divididos sobre Acordo Ortográfico

Os especialistas continuam divididos sobre a utilidade do novo Acordo Ortográfico, uns criticando a "inércia política" que explica a demora na aplicação, outros acreditando que esta acabará por não acontecer.

Em declarações à agência Lusa, a propósito da segunda conferência sobre o futuro da língua portuguesa, que se realiza na terça e quarta-feira, na Reitoria da Universidade de Lisboa, o linguista Malaca Casteleiro atribui à "inércia política" à demora na aplicação do Acordo Ortográfico (AO) aprovado em 1990.

"O acordo tem duas componentes, uma é linguística e a outra é política, e a componente política falhou, porque não houve vontade de levar o AO por diante, houve desinteresse, não houve empenhamento, em todos os países", critica.

Porém, acredita o filólogo e professor universitário, tal não impedirá que o AO venha, efetivamente, a ser aplicado, porque "é bom para a promoção da língua portuguesa no mundo".

Malaca Casteleiro vê igual "empenhamento" em todos os países lusófonos, reconhecendo, porém, que alguns têm sido "mais lentos" na implementação do AO.

"As coisas também estão a avançar em Moçambique e em Angola, está bem encaminhado", nota, recordando que "Angola é que tem suportado muitos custos para a elaboração do vocabulário ortográfico comum".

O linguista considera que "o Brasil não recuou", apenas "prorrogou o prazo da entrada em vigor definitiva", para "dar mais tempo" à adaptação ao novo AO.

Já o classicista Rui Miguel Duarte, primeiro signatário de uma carta aberta contra o AO enviada ao ministro da Educação no início do ano, não duvida do "recuo" brasileiro.

Os políticos brasileiros revelam uma "atitude mais sensata e sensível" do que os políticos portugueses, que "estão numa torre de marfim", compara. "Se Portugal avançar e o Brasil não, não faz nenhum sentido", sustenta.

Angola "tem manifestado desinteresse" em relação ao AO e os outros países africanos "não têm muita disponibilidade para o aplicar, porque chegaram à conclusão de que custaria muito dinheiro", observa o investigador.

Se "já é difícil dominar o português como está", num contexto em que é a segunda língua "para muita gente", mais será se tal implicar a adaptação a um novo formato, constata.

"Espero sinceramente (…) que Portugal se desvincule completamente de tudo isto. Parece-me possível, basta que haja vontade e que os políticos deixem de acreditar em quimeras lusofónicas, ou que isso permite vender mais livros no estrangeiro, ou que isso permite que o português seja uma língua oficial", desvaloriza Rui Miguel Duarte.

O inglês, o francês e o espanhol também têm várias grafias e "nunca sentiram nenhuma necessidade" de fazer uma convenção ortográfica, distingue.

Malaca Casteleiro atribui a contestação ao AO a "uma minoria" e considera que o instrumento é "irreversível", até porque já foi adotado por órgãos de comunicação social e "os livros já se publicam segundo o novo acordo".

Por seu lado, Rui Miguel Duarte diz que o AO está "posto em causa" e "obsoleto". As consequências da aplicação em Portugal têm sido "muito graves", verificando-se uma "balbúrdia ortográfica, até em publicações como o Diário da República", analisa o investigador e estudioso de literatura grega antiga.

"O padrão de erros e a frequência dos mesmos, desde que, na prática, isto entrou ‘em vigor’ é de tal ordem" que "é quase um faça você mesmo", comenta o especialista, notando que as pessoas têm tendência para "generalizar a regra" e, portanto, já se instalou o "fato em vez de facto", quando esta última palavra continua a ser a regra no novo AO.

Assinado em dezembro de 1990 por todos os países lusófonos, o AO, que pretende unificar a escrita da língua portuguesa, deveria ter entrando em vigor a 1 de janeiro de 1994, mas, nessa altura, só Portugal, Brasil e Cabo Verde o tinham ratificado.

Entretanto, foram aprovados dois protocolos de alteração, o segundo dos quais, de 2004, prescindia da aplicação unânime e reconhecia a entrada em vigor a partir de três ratificações.

O AO já foi ratificado por todos os Estados lusófonos, à exceção de Angola e Moçambique, mas apenas Portugal e Brasil se comprometeram com prazos para a aplicação: maio e dezembro de 2015, respetivamente.

Fonte: NM

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